quarta-feira, 20 de março de 2013


A Aula da Lua Cheia Vermelha
... é dando que se recebe ...

Lua cheia,  13 de setembro de 2011. Collaroy Beach, Tasman Sea, Sydney, New South Wales, Australia.

A prática de yoga estava marcada para o final da tarde, à beira do mar, entre a areia e a casa (do Quarteto Fantástico), no gramado verde e macio. 

Minha iidéia era conduzir uma aula para saudar a lua cheia que ía surgir no horizonte, entre o céu e o mar da Tasmania.

O Pic Nic para o pós-aula já estava montado numa cesta: castanhas, frutas, sandwiches, salgadinhos, TimTam (bicoito recheado de chocolate típico Australiano), sucos e vinhos. Confraternização entre amigos, curtindo a aula de yoga de uma mãe visitante professora, requisitada pela turma a dar uma aulinha sempre que possível.

Para minha surpresa e delírio, além de visitar minha filha querida e meu genro,também querido, que registrou tudo com essas fotos , eu compartilhava seus amigos maravilhosos que me pediam o que mais eu queria fazer , Yoga, além de estar com eles e visitar o país.


Cenário e personagens perfeitos! E ainda um dia auspicioso conforme constatei ao consultar o calendário hindu.

 Subha Shivaloka Day
O  Panchangam é um calendário que faz parte da tradição hindu, inicialmente transmitido de pai para filho,  usado como uma ferramenta de planejamento que oferece informações relativas ao tempo e as energias que atuam em cada dia. Com esse conhecimento é possível planejar as atividades de cada dia para estar em sintonia com o universo e fluir  melhor.
Analisando posteriormente o Panchangam do dia da aula da lua cheia, seguindo as informações do Kadavul Hindu Calendar (www.aryabhatt.com/astrology) e relembrando as aulas que tive com meu professor Anderson Allegro, constatei que a energia do dia estava regida pela  constelação chamada Utaraprostapada, favorecendo as  ações que envolvem cuidar dos outros e que busquem sabedoria, conhecimento, alegria e habilidade mental.

Este calendário considera 27 constelações além das 12 do zodíaco, formando um círculo maior que a eclíptica em torno da terra e dos planetas que passam por ela. Combina a energia de cada planeta com a constelação, principalmente por onde a lua passa, já que é esse o planeta que influencia as atividades do dia a dia, de acordo com o Panchamgam.
Nos dias de Lua Cheia, Purnima, recomenda-se fazer oferendas. A oferenda da nossa aula foi a atenção, o tempo e a prática dedicadas àquele momento energético único. Naquele dia o calendário marcava um momento propício para iniciar coisas que vão gerar resultados duradouros. Nossa amizade e cumplicidade naquele ritual lunar estavam abençoados! Subha Shivaloka Day é considerado auspicioso e propicia uma conexão espiritual muito intensa entre o mundo físico e o dos deuses,  como se esses  mundos estivessem  separados apenas  por uma malha fina e transparente. Por essa interpretação, nesse dia  os Deuses podem inspirar as pessoas espiritualizadas e através delas influenciar o mundo.

A aula: um ritual mágico
Mats no gramado, amigos, velas, luzes amareladas vindas da rua, céu estrelado, ar ainda gelado de final de inverno...  Vários Suryas e Chandras  Namaskaras (sequências de posturas da Saudação ao Sol e à Lua) foram nos aquecendo e fomos nos incorporando àquele cenário, saudando à vida, honrando aquele momento divino, único, em contato com a natureza, envolvidos pelo clima de amizade, conscientes dos nossos corpos e de nossa respiração. Os movimentos foram fluindo em ásanas que se encaixavam perfeitamente, nos posicionavam no tempo, no espaço, no encantamento do presente, alinhando nossos chakras para fluir o prana e promover  a vitalidade no corpo físico, sutil e etéreo.
Nenhum planejamento  de aula era necessário. Ao contrário, só cabia ali deixar  fluir a intuição, a sensibilidade e não permitir que a mente interferisse naquela conexão natural e total com o momento, com os elementos, com as pessoas e suas energias. O desafio era deixar-se levar pelo som mântrico das ondas do mar que batiam suavemente e se quebravam na areia, numa cadência infinita, conduzindo o ritmo das nossas respirações (Ujjayi), mantendo o contínuo pulsar dos movimentos entre a terra e o firmamento.
Aos poucos o céu no horizonte foi tingido de vermelho e as águas do mar brilhantes como labaredas  refletiam  um caminho de luz cintilante alaranjada. A luz da lua aumentando,  escancarando,  iluminando e revelando a escuridão da noite.
Escandalizados com a beleza daquela  visão no horizonte,  fomos nos sentando, embriagados por aquela  luz  que dava à lua o brilho dourado típico do sol nascente. Era o nascer da noite! Parecia que em algum momento os planetas, assim como o céu e o mar, se tornavam  um só, e a cor do sol passava  pela luz da lua e iluminava nós ali na terra, nos tornando  unos com o universo.
A aula dos Maha Bhutas, dos grandes elementos (terra, água,fogo,ar e  espaço) foi um presente da  mãe natureza, que os contém e os domina, e só coube à professora conduzir os alunos para se deixarem levar por essas forças, sentindo-as e incorporando-as na forma dos ásanas e das respirações.  
O grande aprendizado foi reconhecer que “ é dando que se recebe”  e a oferenda da prática nos deu um momento de aprendizado inarrável.


Quando o universo conspira à favor, e nós não atrapalhamos, a vida acontece e flui, nos surpreende e nos faz felizes.
Para finalizar aquele momento divino, o Pic Nic recebeu um convidado inesperado e especial, um vizinho atraído pelo momento mágico  veio contar histórias e tocar gaita, cantar e celebrar  conosco o ritual da Lua Cheia Vermelha.











fotos: Marco Estrella